Como envelhecer com saúde e disposiçãoDra. Jocelem Mastrodi SalgadoProfa. titular de Nutrição – LAN/ESALQ/USPNos últimos 50 anos, o número de pessoas com idade acima de 65 anos, especialmente nos países desenvolvidos, tem aumentado consideravelmente. Nos Estados Unidos, em cada 10 cidadãos 1 tem idade acima de 65 anos e projeta-se que no final deste século, 14% da população dos Estados Unidos estará com idade acima de 65 anos. O Brasil, à semelhança dos demais países latino-americanos, está passando também por um processo de envelhecimento populacional rápido e intenso. Em 1980, o país ocupava o 10o lugar, com base em sua população acima de 60 anos; no ano 2025 essas pessoas passarão a representar 14% da população total brasileira, devendo o Brasil ocupar o 6o lugar na esfera mundial, com uma estimativa de 31,8 milhões de idosos. Mantendo-se a tendência demográfica atual, em números absolutos, o Brasil terá uma das maiores populações de idosos do mundo.
Desde 1968, a expectativa de vida tem aumentado em 3 a 4 anos. Na década de 50, quando a expectativa de vida do brasileiro não chegava aos 50, no ano 2025 ultrapassará os 70 anos. A mulher, ao fim de seu período fértil, que até 1970 tinha em média mais de cinco filhos, iniciará o novo século com dois filhos. Portanto, o envelhecimento da população dar-se-á a um ritmo mais acelerado do que o observado na taxa global de crescimento.
Hoje, a terceira idade representa em custo assistencial, um ônus extremamente pesado para os Sistemas Sociais de Saúde da maioria dos países, dada a maior incidência de doenças e incapacidade física e mental dos idosos. Nos países em desenvolvimento, como no Brasil, esta situação é agravada, principalmente, em conseqüência da má-nutrição dos idosos.
Assim, tendo em vista todas essas informações, o estudo e o conhecimento do processo de envelhecimento ganhou interesse considerável nos anos recentes. Agora, mais do que nunca, existe um interesse crescente em se identificar os fatores que levam a um envelhecimento sadio. Além disso, existe também um grande interesse dos estudiosos em nutrição para ligar as práticas dietéticas com a redução ou retardo das mudanças e doenças que surgem com o envelhecimento, já que a boa nutrição está associada com o aumento da qualidade e expectativa de vida das pessoas.
O processo de envelhecimento e a importância da boa alimentação
O envelhecimento é um processo normal que começa com a concepção e termina com a morte. O envelhecimento fisiológico de uma pessoa começa no final do período de crescimento e desenvolvimento. As mudanças ocorrem lentamente e são influenciadas pelos eventos da vida, enfermidades, heranças genéticas, estresse ou estado sócio-econômico, acesso à cuidados médicos e com o ambiente. Em razão dessas influências sobre as pessoas, está cada vez mais claro que o envelhecimento cronológico é bem diferente de um envelhecimento fisiológico e funcional. Portanto, pessoas da mesma idade cronológica, sobretudo após os 60 anos, podem ter seu envelhecimento funcional e fisiológico diferenciado. Essa diferenciação é acentuada com o avanço da idade, tornando as pessoas diferentes de seus contemporâneos, de mesma idade cronológica.
As mudanças degenerativas que acompanham o envelhecimento não são bem entendidas, embora um certo número de teorias tenham sido propostas para explicar, pelo menos em parte, a deterioração que é observada. Não se sabe se as mudanças são programadas de forma inevitável no genoma, ou se elas ocorrem como resultado de uma exposição durante a vida toda à influências ambientais, tais como estresse, nutrição ou radiação solar.
Entretanto, estudos mostram que dentre os fatores que podem condicionar a qualidade de vida e a longevidade do ser humano, a nutrição é um dos principais, sendo que várias mudanças decorrentes do processo de envelhecimento podem ser atenuadas com uma alimentação adequada e balanceada nos aspectos dietético e nutritivo.
Estudos tem demonstrado que as condições nutricionais da população idosa brasileira é preocupante. Os efeitos da alimentação inadequada, tanto por excesso como por déficit de nutrientes, tem grande incidência, o que reflete num quadro latente de má-nutrição em maior ou menor grau. Em termos absolutos, estima-se que no Brasil exista cerca de 1 milhão e 300 mil idosos com baixo peso, sendo que a desnutrição representa, atualmente, mais de 35% nos registros de mortes de idosos brasileiros nas regiões metropolitanas. Estima-se também que mais de 15% dos idosos consumam menos de mil Kcal/dia.
Dentre as principais causas que levam o idoso à perda de peso e à desnutrição estão as alterações fisiológicas próprias do envelhecimento, as enfermidades crônicas e fatores relacionados à situação social do idoso. Com relação às alterações fisiológicas, sabe-se que o envelhecimento leva a efetivas reduções na capacidade funcional, desde a sensibilidade para os gostos primários até os processos metabólicos do organismo. Mastigação e deglutição prejudicados, falta de dentes, entre outros fatores, levam o idoso a uma ingestão nutricional deficiente. As doenças crônicas, que muitas vezes são decorrentes de uma má alimentação na vida adulta, são também citadas como fatores que levam o idoso à desnutrição.
O uso de múltiplos medicamentos, os quais influenciam a ingestão de alimentos, a digestão, absorção e utilização dos diversos nutrientes, pode comprometer o estado de saúde e o requerimento nutricional do idoso. Fatores sociais como a perda do cônjuge, isolamento social e depressão, podem interferir amplamente. O modo de vida, geralmente solitário da maioria dos idosos, impõe-lhes muitas limitações.
A solidão predispõe o idoso à falta de ilusão e preocupação consigo, fazendo com que se alimente mal e pouco. Nesses casos, há uma tendência ao desestímulo para preparar alimentos variados e nutritivos. Verifica-se, com freqüência, elevado consumo de produtos industrializados como doces e massas, ou de fácil preparo como chás e torradas, o que afeta a adequação de nutrientes ao organismo e o coloca em risco de má-nutrição.
A capacidade de deslocamento do idoso, ou seja, de realizar sozinho as atividades cotidianas, gera má-nutrição também, pois nessas circunstâncias, a aquisição de alimentos e o preparo das refeições pode se tornar muito difícil.
As necessidades nutricionais do idoso
As necessidades nutricionais das pessoas idosas são essencialmente individuais, em razão das diferenças na progressão do processo degenerativo e da intercorrência de enfermidades. Em pessoas idosas, as exigências nutricionais dependem do estado geral de saúde, dos níveis de atividade física, das alterações na capacidade de mastigação, digestão e absorção dos nutrientes e da eficiência do metabolismo, além de alterações no sistema endócrino e no estado emocional.
Geralmente, as necessidades energéticas são consideradas mais baixas após os 55 anos para ambos os sexos. As recomendações dietéticas pedem após os 55 anos de idade, normalmente, uma redução das doses médias de energia de 600 Kcal/dia para o homem e 300 Kcal/dia para as mulheres.
O uso de carboidratos complexos e fibras na dieta (cereais como aveia, farelo de trigo, arroz integral, frutas e hortaliças) são altamente indicados por serem importantes na prevenção e controle de doenças cardiovasculares, diabetes, constipação, entre outras, comuns nesta fase da vida. O uso de açúcar (principalmente o refinado) deve ser reduzido a fim de melhorar a sensibilidade à insulina, pois existem evidências de que com o avanço da idade ocorre uma diminuição da tolerância à glicose.
Com relação à proteína, estudos recentes mostram que o requerimento protéico para a pessoa idosa saudável não diminui com a idade e deve estar entre 0,8 a 1,0g/Kg de peso corporal/dia. Mas, em casos de doença (traumas, cirurgias e infecções), a oferta de proteína deverá corresponder a até 16% do valor energético ingerido.
Quanto aos lipídios, existem evidências de que o consumo elevado de gorduras saturadas no idoso está relacionado com a maior incidência de desordens cardiovasculares e câncer. Por isso, recomenda-se que a pessoa reduza o uso de gordura saturada e colesterol, substituindo-os pela gordura insaturada. Substituir as carnes gordas (bovina, suína), embutidos em geral (lingüiça, salsicha, salame, etc), por alimentos como as carnes magras e carnes brancas (frango sem pele e peixes) e dar sempre preferência ao azeite de oliva no preparo dos alimentos.
Com relação às vitaminas e minerais, vários estudos tem demonstrado que os requerimentos de minerais e vitaminas no idoso não se encontram alterados, desde que as pessoas sejam saudáveis e possuam bons hábitos alimentares. Mas determinadas condições de saúde, como por exemplo o estilo de vida solitário do idoso, indicam suplementação vitamínica e de minerais.
A água, que é um nutriente muito importante nos idosos, muitas vezes é esquecida. A inadequada ingestão de água pelos idosos leva a uma desidratação rápida e a problemas associados com hipertensão, elevação na temperatura corporal, constipação, náuseas e vômito, secura das mucosas, diminuição da excreção da urina e confusão mental.