Velhos vilões ou novos mocinhos?
A última palavra da ciência sobre o ovo, a gordura, o sal, o açúcar, a carne vermelha, o café e o chocolate
Numa crônica publicada em 1997, o escritor João Ubaldo Ribeiro desabafou, com seu tom irônico e impagável: “Não agüento mais de culpa, acusado de suicidar-me a cada instante”. O texto falava sobre alimentos que lhe rendiam prazeres, mas que estavam condenados, como a manteiga: “Deve ser incluída nas listas de drogas proibidas, juntamente com cocaína e heroína”.
Sobre o café: “Causa males recentemente descobertos por um laboratório de Glasgow ou Amsterdã ou Jacarta, que poderão deixar o freguês abestalhado, tarado, astênico ou hiperexcitável a ponto de matar a família e ir ao cinema”.
Referia-se à carne: “É caso de se embuçar para ir a uma churrascaria”. Para o ovo reservava um suspiro de adeus: “E uma omeletezinha? E ovos estrelados, daqueles reluzentes como o sol, que a gente encarava com requintes de esfregadinhas de pão na gema? Com presunto? Com bacon? Livrai-nos, Senhor, de todas essas pragas infernais”.
O tempo passou e as gostosuras citadas pelo escritor baiano saíram da lista negra e reconquistaram lugar à mesa. A tônica da nutrição, agora, é desaconselhar cortes radicais. “Não existe alimento vilão, mas consumo vilão”, diz o cardiologista e nutrólogo Daniel Magnoni, chefe de nutrição clínica do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, em São Paulo. Com bom senso, esses prazeres podem, sim, compor os melhores cardápios.
Velhos vilões ou novos mocinhos?
OVO
VILÃO - Em 1973, a Associação Americana do Coração limitou o colesterol a 300 miligramas por dia por causar distúrbios cardiovasculares. Como uma gema tem 215 miligramas, o ovo foi considerado uma bomba.
MOCINHO - Pesquisas dos anos 90 o absolveram. Especialistas da Universidade Harvard provaram que o consumo diário não eleva a incidência de infartos e derrames. Mais de 100 estudos o inocentaram. “O ovo é fonte de proteína de alto valor biológico, vitaminas do complexo A, B, D, E e K e de micronutrientes como colina, fundamental para a memória e o aprendizado e talvez tão importante quanto o ácido fólico para a formação do sistema nervoso fetal”, diz Ana Beatriz Leme da Fonseca, da VP Consultoria Nutricional, em São Paulo.
ÚLTIMA PALAVRA - Ovos no café-da-manhã podem ajudar a emagrecer. Uma equipe da Universidade Estadual da Louisiana comparou mulheres em dieta. Metade fazia o desjejum com torradas. A outra consumia ovos mexidos. A perda de peso foi 65% maior no grupo dos ovos.Um ovo por dia se a dieta é balanceada e o colesterol normal. Com taxas altas, três por semana.
QUANTIDADE - Um ovo por dia se a dieta é balanceada e o colesterol normal. Com taxas altas, três por semana.
CAFÉ
VILÃO - Responsável pela riqueza do Brasil até a quebra da bolsa de Nova York em 1929, foi para o banco dos réus em 1978, quando a agência americana que controla alimentos e remédios questionou os efeitos da cafeína que podia prejudicar a fertilidade, causar úlceras e gastrites e atrapalhar a absorção de cálcio, contribuindo para enfraquecer os ossos e aumentar a pressão arterial.
MOCINHO - A reabilitação veio com a descoberta da presença de antioxidantes, capazes de bloquear os radicais livres, que acarretam distúrbios cardíacos. Japoneses revelaram que protege contra o câncer de fígado. Há evidências de que melhora a memória e a concentração, reduzindo o risco de doenças neurodegenerativas, como Parkinson. Pode evitar alterações de humor e depressão, de acordo com estudos da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Segundo médicos da Universidade Harvard, aumenta a sensibilidade à insulina, prevenindo o diabetes. Pode ajudar a emagrecer por ativar a queima de gordura.
ÚLTIMA PALAVRA - Moderação. Em excesso, agrava úlceras, arritmias cardíacas, ansiedade e distúrbios do sono em pessoas predispostas.
QUANTIDADE - Três xícaras por dia. Se for expresso, apenas uma. O filtro de papel reduz as concentrações de cafestol e kahweol, que aumentam o colesterol.
AÇÚCAR
VILÃO - As críticas começaram em 1975 com SUGAR BLUES, do jornalista americano William Dufty. O livro culpava o açúcar de provocar diabetes, alergias, fadiga, dores de cabeça e depressão. Foi massacrado por cientistas. Até que estudos confirmaram algumas teses de Dufty, 20 anos depois, caso das dietas de Atkins e de South Beach, que cortam os carboidratos, dos quais o açúcar é o maior representante.
MOCINHO - osso primeiro produto de exportação, o açúcar é fonte de energia rápida e barata, útil ao crescimento e à atividade cerebral. Por ser menos calórico do que a gordura, o açúcar ficou em segundo plano enquanto ela virou a grande responsável pelo avanço da obesidade.
ÚLTIMA PALAVRA - Em excesso, engorda. Eleva, de forma rápida, os níveis de glicose no sangue e acarreta alta liberação de insulina, sintetizada pelo pâncreas para garantir a chegada da glicose às células. Só que insulina demais estimula o corpo a armazenar gordura, aumenta o colesterol e desregula o pâncreas. Resultado: cresce o perigo de doenças cardiovasculares. Os picos de insulina levam à produção de radicais livres, que destroem tecidos e provocam o envelhecimento. São indicados os açúcares complexos, de frutas. Digeridos devagar, trazem vitaminas e minerais, não encontrados no refinado.
QUANTIDADE - No máximo 4 colheres (chá) diárias. Cada colher (sachê) equivale a 5 gramas e fornece 20 calorias.
SAL
VILÃO - A ingestão exagerada leva à retenção de líquido, prejudica a tireóide e aumenta a pressão arterial, fator de risco para infartos e derrames. Estudo publicado em 1988, o Intersalt, avaliou mais de 10 mil pessoas em 32 países e concluiu que a pressão arterial é mais baixa entre os que ingerem pouco sal, caso dos índios ianomâmis, no Brasil.
MOCINHO - Realça o sabor e ajuda a conservar os alimentos. No Brasil, o sal foi escolhido como veículo para reposição de iodo, a fim de prevenir o bócio, a alteração da glândula tireóide. “Está presente em todos os tecidos humanos – por isso o suor e a lágrima são salgados –, participa da transmissão de impulsos nervosos e ajuda a regular a passagem de líquidos pelas membranas celulares”, diz a nutricionista Lara Cunha.
ÚLTIMA PALAVRA - As restrições diminuíram desde a descoberta de que algumas pessoas têm níveis normais de pressão, mesmo abusando do sal, devido a fatores genéticos. “Devemos dosar o sal e diminuir os embutidos, enlatados e conservas”, afirma o médico Daniel Magnoni.
QUANTIDADE - Duas colheres (café) rasas por dia (4 gramas). O brasileiro consome três vezes mais: 12 gramas.
Chocolate
VILÃO - O efeito deletério à silhueta foi o que mais pesou contra a delícia que maias e astecas consideravam o alimento dos deuses. Isso porque a maioria dos chocolates contém altos teores de gordura e açúcar, que levam ao ganho de peso. Uma barra de 100 gramas de chocolate ao leite fornece em média 530 calorias.
MOCINHO - No fim dos anos 90, foram encontrados nele flavonóides, antioxidantes capazes de proteger o coração e prevenir diabetes. Contém substâncias moduladoras do humor e magnésio, mineral cuja falta favorece a tensão pré-menstrual. Pesquisadores da Universidade de Colônia, na Alemanha, constataram redução da pressão arterial em quem consumia 6 gramas diários. Outro trabalho de 2007 verificou queda nos níveis de colesterol. Os estudos se referem ao chocolate amargo, que apresenta mais cacau e menor teor de açúcar e gorduras.
ÚLTIMA PALAVRA - Consumido em pequenas doses diárias, ajuda no combate à compulsão por doces.
QUANTIDADE - Uma barra (30 gramas) de chocolate amargo (80% de cacau) por dia. Tem 184 calorias e não compromete a saúde.
ATENÇÃO
Procure seu médico para diagnosticar doenças, indicar tratamentos e receitar remédios. As informações disponíveis neste Blog possuem apenas caráter educativo.
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